BRUMADINHO

Dr. Ismael José Vilela

A catástrofe ocorrida em Brumadinho, Minas Gerais, há alguns dias, tem suscitado questionamentos de toda ordem: policial, jurídico, político, administrativo, econômico, social, psicológico etc.

Há, entretanto, uma pergunta a ser colocada neste momento, e cuja resposta poderá  fundamentar e iluminar as respostas às outras:

Como compreender e vivenciar a nossa relação com a natureza, com a criação?

O Papa Francisco, em sua encíclica Laudato Si, baseando-se principalmente na tradição judaico-cristã, apresenta-nos uma alternativa de resposta, que poderá inspirar a reflexão e a ação no que diz respeito à nossa relação com a natureza, com a criação.

A mensagem de cada criatura na harmonia de toda a criação.

O fato de insistir na afirmação de que o ser humano é imagem de Deus não deveria fazer-nos esquecer que cada criatura tem uma função e nenhuma é supérflua. Todo o universo material é uma linguagem do amor de Deus, do seu carinho sem medida por nós. O solo, a água, as montanhas: tudo é carícia de Deus. A história da própria amizade com Deus desenrola-se sempre em um pedaço geográfico que se torna um sinal muito pessoal, e cada um de nós guarda na memória lugares cuja lembrança nos faz muito bem. Quem cresceu no meio de montes, quem na infância se sentava junto ao riacho a beber, ou quem jogava em uma praça do seu bairro, quando volta a esses lugares sente-se chamado a recuperar a sua própria identidade.

Deus escreveu um livro estupendo, “cujas letras são representadas pela multidão de criaturas presentes no universo” (São João Paulo II). E justamente afirmaram os bispos do Canadá que nenhuma criatura fica fora desta manifestação de Deus. “Desde os panoramas mais amplos às formas de vida mais frágeis, a natureza é um manancial incessante de encanto e reverência. Trata-se de uma contínua revelação do divino” (Conferência Episcopal do Canadá). Os bispos do Japão, por sua vez, disseram algo muito sugestivo: “Sentir cada criatura que canta o hino da sua existência é viver jubilosamente no amor de Deus e na esperança”(Conferência dos Bispos Católicos do Japão). Essa contemplação da criação permite-nos descobrir qualquer ensinamento que Deus nos quer transmitir através de cada coisa, porque, “para o crente, contemplar a criação significa também escutar uma mensagem, ouvir uma voz paradoxal e silenciosa” (São João Paulo II). Podemos afirmar que, “ao lado da revelação propriamente dita, contida nas Escrituras Sagradas, há uma manifestação divina no despontar do sol e no cair da noite” (São João Paulo II). Prestando atenção a esta manifestação, o ser humano aprende a reconhecer-se a si mesmo na relação com as outras criaturas: “Eu me expresso exprimindo o mundo; exploro a minha sacralidade decifrando a do mundo” (Paul Ricoeur).

(Papa Francisco, Laudato Si, n. 84-85)

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