Uma Bem-aventurança é um horizonte

Estamos dentro daquilo que nós chamamos de bem-aventuranças. Uma das bem-aventuranças de Jesus, que no Evangelho de Mateus é a primeira (5, 3), diz: “Bem-aventurados os pobres em espírito porque é deles o Reino de Deus”.

Uma bem-aventurança é um horizonte. A nossa vida precisa de horizonte. Às vezes parece que a nossa existência acaba nos nossos sapatos, que é a única coisa que vemos quando se tem a cabeça virada para baixo. Não nascemos para viver a olhar para os sapatos, mas para o futuro. Precisamos de sentir que há um projeto, que somos projetados mais além, que tudo não acaba aqui e agora, que o que fazemos não acaba numa tarefa mas é um diálogo com o que está mais longe. O que por vezes nos sufoca é o ar pesado de uma vida fechada em si mesma. Como se vivêssemos num quarto a vida toda com as janelas fechadas sem nunca entrar o ar. Pensar nas grandes questões, no que dá sentido à vida. E é neste contexto que se situam as bem-aventuranças que Jesus oferece.

“Bem-aventurados os pobres em espírito porque é deles o Reino de Deus”. Antes de tudo, a pobreza é uma atitude espiritual, interior. Não estamos a falar de economia. A pobreza é uma atitude do coração, voluntária, ao passo que a pobreza econômica vem de fora e pode ser uma imposição, como acontece com o desemprego, que é uma catástrofe. Mas no Evangelho fala-se de outra pobreza, que é uma escolha, que nos vem de dentro, um estilo de vida, uma maneira de estar e de reagir, uma forma de nos situarmos neste jogo que é a vida.

O coração pobre vive na abertura, não se fecha, não se tranca, vive na atenção, na vigilância, na espera, na disponibilidade. Falta-nos a disponibilidade de entrarmos em diálogo, de sermos simples, de aprendermos como os pequenos, que quando dão a mão a alguém têm o coração e o espírito livre para saborear o caminho, que para elas não é, como para nós, um corredor noturno e sonâmbulo em que só se vê uma coisa: a meta. E quem só vê a meta, não caminha.

“Agradece a quem quer que venha, porque cada um foi enviado como um guia do Além”. Agradecer. É esta a pobreza de coração.

Cardeal D. José Tolentino Mendonça© (Extraído da página do Facebook: https://www.facebook.com/comodissetolentino)


Deixe um comentário