*Dra. Cecília Braconnot Machado
Quando se ouve falar em inconsciente, imediatamente vem à nossa mente o inconsciente psíquico, com seus elementos impulsivos, conflitos psicológicos, traumas, complexos, ou seja, memórias negativas. O neuropsiquiatra austríaco, Viktor Frankl, traz ao nosso conhecimento uma novidade: o inconsciente espiritual, ampliando a ideia que se tinha até então. Sem eliminar o que já foi descoberto, enriquece ainda mais a visão de ser humano.
Ele fala das dimensões do ser humano, que não são somente biológicas e psíquicas, mas também espirituais. A pessoa completa é bio-psico-espiritual. Como fruto dessa essência, que é espiritual, o ser humano é livre, podendo responder com liberdade aos seus condicionamentos, não sendo vítima destes.

Também são frutos do espiritual a criatividade e a intuição. Assim como a música e todo tipo de arte; a amizade, o amor, a busca da verdade. A espiritualidade é também mística, mas não só, o espiritual é natural em todo ser humano e independe da religiosidade.
Enquanto que é próprio da dinâmica psíquica a satisfação das necessidades, sempre buscando o bem estar, percebe-se que, mesmo quando se atinge um bom nível de equilíbrio, fica faltando um algo a mais.
Essa necessidade de “algo a mais”, de encontrar sentido na vida, de conhecer a sua origem não vem do psicofísico, e sim do mais profundo do ser, da sua dimensão espiritual.
Outrossim, no momento em que a vida me chama, que me convoca a ter uma atitude interna ou uma ação, percebo que não estou em vão no mundo, que eu tenho algo a cumprir, que cada pessoa como única e irrepetível tem algo a cumprir. Este é o caráter da incumbência, da missão. Para que eu existo? Existo para um objetivo, um propósito. Eu tenho a possibilidade e até mesmo a capacidade de responder a esse convite da vida.
Assim, da dimensão espiritual vem a capacidade de se posicionar diante dos próprios impulsos. Ela olha além de si mesma e vai em direção ao outro; percebe o chamado da vida e junto a ele, a tarefa a realizar e intui a resposta que pode e deve dar.
Frankl chama essa capacidade de se posicionar diante de si mesmo, de auto distanciamento e acontece quando ela, a pessoa, se eleva a um outro nível, nível dos fenômenos propriamente humanos. Esse é o nível da criatividade, das inspirações mais profundas, do chamado mais profundo à vida, da vontade de sentido, da busca de sentido.
É nesse instante que vem do nível mais profundo, a busca do princípio, de onde eu vim, a busca última da vida, o desejo de religar-se à própria origem, por isso a religiosidade brota do nível mais profundo do ser.
Desse modo, o psíquico sempre busca satisfação de necessidades e o espiritual busca o sentido, a razão da existência, o religar-se. O nível consciente é o nível da lógica, da razão. Diante disso o inconsciente é antes da lógica, antes da razão e, portanto, é intuitivo.
Assim sendo, na sua dimensão espiritual o ser humano não adoece e, consequentemente, não precisa e nem é possível tratamento. O que pode acontecer é o fato de ele “dormir”. Nesse estágio, o terapeuta e o educador, em todas as suas formas, devem “despertar” e trazer à consciência todas as possibilidades e potencialidades que podem estar “adormecidas” no inconsciente espiritual.